sexta-feira, 25 de agosto de 2017

A minha gata Bia e a superação da deficiência visual...


Quando me disseram que iria ficar cega, a princípio passei por um momento de “negação”. Porém, com o tempo, deparei-me com os primeiros sintomas da doença visual a progredir, que me fez passar por um estágio de “choro” a que chamei luto. Sim, o luto da visão que estava a morrer em mim.

Foi nessa altura que adotei a minha gata Bia. Algumas pessoas parecem rir quando digo que a minha gata Bia me ajudou a superar a deficiência visual.


Aliás, já me disseram que eu até ultrapassei as fases desta perda de uma forma rápida e que há pessoas que não passam do primeiro estágio da negação.

Cada caso é um caso e neste blogue partilho apenas a minha experiência de vida.

Uma das coisas que senti, quando o médico me disse que ia ficar cega, foi uma tendência para achar que agora toda aquela situação me iria condicionar a vida para sempre.

E realmente, após uma deficiência visual, a vida que antes tínhamos tem de ser renovada a partir de nós mesmos.


Por mais que queiramos fingir que aquilo não nos está a acontecer, o melhor que fiz foi quando assumi que era deficiente visual e ponto final.

Sim, ainda chorei muitas vezes diante da morte da minha visão porque a morte dos meus olhos ocorria rapidamente, sem data previsível para o enterro, pois esta data poderia ser daqui a algumas semanas como daqui a alguns anos.

E depois o que vou fazer, quando ficar cega?

A resposta mais fácil diante de tudo isso, é tentar esconder-me no meu mundo de quatro paredes da minha casa e me sentir a pessoa mais injustiçada da face da terra. Será que vale a pena a vida que ainda me resta?

Esses pensamentos foram os primeiros que inundaram a minha mente diante do primeiro impacto que a progressiva cegueira causou na minha vida.

Mas depois eis que de manhã, quando não queria sair da cama, a minha gata Bia vinha até mim, a miar… E não apenas a Bia, mas também a Lady (a gata Lady ainda estava viva na altura) e depois o Jordan …


Quando adotei a Diana Riscas, ainda mais que esta gata é tão faladora, então é que me apercebi de algo muito importante que ainda não tinha notado.


Aos poucos, fui voltando a ter atividade na minha vida, porque senti que à minha volta alguém ainda precisava de mim.

Os gatos precisavam que eu cuidasse deles. O meu marido precisava que eu cuidasse dele. Os meus canários precisavam que eu cuidasse deles…


Cuidar, eis uma das palavras que fazem mover uma deficiência e coloca-la no seu lugar.

Digo que é uma das palavras, porque aos poucos irei partilhar neste blogue as quatro palavras que têm me ajudado nesta minha luta a viver para além da deficiência visual.

Parece fácil assim dizer, que são apenas quatro palavras, mas estas palavras devem estar ligadas a atitudes e estas atitudes não são fáceis de fazer quando iniciamos esta luta com a deficiência visual…

Deve-se dar um passo de cada vez, dia após dia...

Mas é preciso sairmos de nós mesmos. Não nos podemos fixar em nós mesmos!

Por isso, quando deixei de me olhar para mim, e comecei a olhar para o que os outros que ali estavam ao meu lado precisavam, foi como que uma alavanca que todos os dias me arranca do pasmo e da insegurança.

Por exemplo, na passada semana quando fui ao programa "Juntos à tarde" na TV SIC em Portugal, se eu pensasse em mim, apenas em mim e na minha limitação como deficiente visual, não conseguiria ir ali e ser entrevistada em direto.


O frio que senti na barriga, aquele nervoso miudinho… Ah, como vou conseguir falar num programa de televisão? Será que vou gaguejar? Será que vou falar alguma palavra mal?

Mas vou!

Vou, pela Bia e pela sua história. Porque os gatos de rua merecem ser adotados, mesmo sendo adultos.


Vou, porque preciso expor a todos que a Bengala Verde pode ser um sinal de distinção para os que sofrem de baixa visão. 

Vou, porque preciso falar do que é a baixa visão e da minha doença que é apenas uma em tantas outras que causam a baixa visão em milhões de pessoas em todo o mundo.


Vou porque não posso ficar inerte com o meu livro “Bia por um triz” escondido, pois ele precisa ser lido, para que a mentalidade que as pessoas ainda têm dos gatos seja mudada.

Sei que é um simples livro, e o que eu digo aqui são simples palavras.

Não estou aqui a dar conselhos a ninguém sobre o que deve fazer...

Aqui apenas falo da minha experiência pessoal, repito mais uma vez.

Para mim, pensar que outros precisam de mim foi o primeiro passo para seguir em frente.

Estes “outros” podem ser pessoas, animais ou até uma planta…


Cuidar de uma planta, todos dias, também requer um cuidado diário.

Tenho plantas em casa que são também seres que necessitam que as regue, que as mude de lugar de vez em quando, enfim, há que cuidar do que nos rodeia.

E cuidar da Bia foi uma partilha que virou uma história “Bia por um triz”.

É possível um gato nos ensinar a recomeçar?


Sim, quando estamos atentos ao que se passa à nossa volta e fazemos esta pergunta:

Onde e quem precisa de mim à minha volta, na minha casa, na minha cidade, no meu quarto?

Não precisamos ir muito longe…

Tenho certeza, que ali, mesmo ao teu lado… está alguém que precisa nem que seja que lhe dês um sorriso… Ou nem que faças apenas uma oração, com o seu pensamento positivo pois se somos o que pensamos, então temos de acreditar que é possível fazer grandes mudanças com mudanças de pensamentos e a partir dos pequenos gestos no dia após dia…

Um passo de cada vez...

Um dia de cada vez...


E pensam que paro por aqui? Já tenho uma outra entrevista na TV, nos próximos dias para falar do meu livro, que depois irei revelar quando tudo estiver confirmado. 

E no dia 14 de setembro de 2017, pelas 19 horas, vou estar na Feira do livro no Porto a autografar o meu primeiro livro "Bia por um triz" e com a minha bengala verde sempre a meu lado.


Obrigada a todos que já adquiriram o livro e que por mensagem por facebook ou para o email partilharam o que sentiram ao ler o livro. 

Aqui deixo um agradecimento muito especial aos meus amigos que compareceram na Apresentação do livro no dia 26/07/2017 na Chiado Café Editora no Porto.

E ainda deixo aqui um agradecimento muito especial à minha terra de origem de coração - Sanfins do Douro - onde o meu livro, todos os dias, desde o lançamento está a ser lido e adquirido, pois há uma outra palavra que nos ajuda a avançar na deficiência visual - APOIO - da família, dos amigos, da terra que te ama e que te aceita desde sempre, e isto sim é reabilitar concretamente um deficiente  visual. Mas este tema deixo para o meu próximo artigo.

Obrigada aos que me perguntaram sobre a bengala verde via facebook após a minha entrevista na SIC.

Se ainda não viu, convido-te a ver e ouvir a entrevista completa feita por mim, Rosária Grácio, no programa "Juntos à tarde" no dia 14/08/2017, com os apresentadores Rosária Grácio e Rita Ferro Rodrigues em 

sic.sapo.pt/Programas/juntos-a-tarde/historias-de-4-patas/2017-08-14-Historias-de-4-Patas---Livro-Bia-por-um-Triz.mp4

sexta-feira, 18 de agosto de 2017

Bengala Verde – Ver de novo… Ver de outra maneira…




Na passada segunda feira, dia 14 de agosto de 2017,  estive na TV SIC a divulgar o meu livro “Bia por um triz” e aproveitei para usar a minha Bengala Verde, e assim também partilhar com a multidão de pessoas que veem aquele canal televisivo o porquê de muitas vezes, nós baixa visão, sermos discriminados quando somos confundidos com os cegos totais.

Foi tão pouco tempo para falar de tantas coisas, contudo, penso que usei aquele pouco tempo ao máximo que pude, e de uma maneira firme, porque nem sempre podemos ter uma oportunidade como esta.


Por isso, nem tudo foi dito acerca da bengala verde…  Seriam precisos muitos mais minutos para expor um pouco mais sobre a origem da "Bengala verde", e outros casos como eu, porque infelizmente, quem tem baixa visão não são tão poucas pessoas como se julga.


Aliás, após o programa fui contactada por algumas pessoas que padecem da minha doença e para elas, usar uma bengala com uma cor que as diferencie dos cegos poderá ser a sua maneira de se libertar dos preconceitos e finalmente sair de casa.


Segundo o Programa Nacional para a Saúde da Visão, estima-se que só em Portugal, serão cerca de 35.000 pessoas, que estão a sofrer de baixa de visão devido a várias doenças. 
(Dados consultados em www.retinaportugal.org.pt/bv)


Estou a falar aqui de uma real situação de deficiência visual que atinge grande parte da população em Portugal. Se também falarmos em termos de números mundiais, a quantidade de pessoas afetadas aumenta de forma assustadora.


Igualmente, não há tempo para falar-se em conscientização, pois a vida apressada dos dias de hoje guia-se mais pela rapidez do que pela ponderação.  É preciso que haja um sinal fácil de propagar ao público em geral, acessível às pessoas, independente da sua cultura e apesar da precariedade económica pois comprar uma simples bengala não é muito caro.


Uma simples bengala verde poderá ser apenas uma maneira fácil de atingirmos todos estes objetivos sem grande esforço.

Mas muitos perguntam:
 - Por quê na cor verde?


Uma das coisas que soube da origem da bengala verde que mais me entusiasmou foi o facto da cor verde utilizada na bengala prender-se não só pela cor verde ser associada à esperança. Sim, nós baixa visão precisamos ter esperança e esta bengala verde é muito mais do que uma simples bengala na cor verde … Mas a bengala verde não é da cor verde só por causa disso!

Esta bengala verde também nasceu de uma vontade de “ver de novo” ou “ver de outra maneira”!

Sim, a bengala é “verde” porque significa ver de novo” ou ver de outra maneira”.

Porque Ver de novo” ?

Sim, é necessário que nós, que sofremos de baixa visão, possamos encontrar maneira de ver de novo” o mundo à nossa volta. Mesmo que a vista nos falte e nos condicione, nunca nos podemos deixar condicionar por esta limitação. Aliás, esta limitação pode até nos condicionar em algumas formas de fazer e viver, mas o primeiro passo nesta luta é aquele reencontrar do “ver”


Sim, é possível ver de novo”, e a bengala verde irá ver por nós. 

Claro que até podemos dizer que se formos acompanhados por alguém a nosso lado, até nos desenrascamos… E se tiver um apoio de um guarda-chuva ou de um carrinho de compras, até podemos fingir que ainda vemos as coisas… Mas, no meu caso pessoal, foi através da bengala verde, que eu finalmente deixei-me destes subterfúgios e saí de casa.


Ainda na passada semana, no mesmo programa “Juntos à tarde” na Sic, os deficientes visuais entrevistados revelaram que o maior obstáculo para nós deficientes visuais são as limitações colocadas pela sociedade que nos rodeia.
(Ver em sic.sapo.pt/Programas/juntos-a-tarde/a-conversa/2017-08-10-A-Conversa-sem-tabus---Deficientes-Visuais )

Sim, quando saímos à rua com a nossa bengala, ouvimos certos comentários, na maioria das vezes, sem má intenção mas infelizmente são estes comentários provenientes da falta de conhecimentos que nos leva a retrair e até negar usar uma bengala para que "as pessoas não pensem que andamos a fingir de ceguinhos” pois “ainda vê qualquer coisa, não é, então porque usa a bengala?" 

Ah, existem óculos e operações à vista e até parece que andamos aqui a fugir da cura e que preferimos andar de bengala quando na verdade até "vemos qualquer coisinha"…

Contudo, essa “coisinha que ainda vemos” é a que nos faz esbarrar e tropeçar nas coisas, que nos faz passar pelas pessoas sem as cumprimentar, que nos faz deixar cair a chave no chão e a perdermos de vista, que nos faz cair num buraco que afinal não vimos, ou que nos faz colocar as coisas no local errado, tropeçar nas crianças e animais que correm pela calçada…e então quando isso nos acontece, ouvimos do outro lado palavras de recriminação como “não vê por onde anda? “ ou  “Vê se tem atenção para não andar a tropeçar aqui e ali e se magoar ou magoar os outros…


Enfim, por esta altura, perguntamo-nos, afinal, de que adianta andarmos a fingir que não precisamos da bengala, porque afinal de contas, precisamos mesmo dela e é a própria sociedade que nos recrimina quando não a usamos!

Por isso, quando o programa “Juntos à tarde” aceitou  entrevistar-me e coloquei-lhes que poderia também falar da “Bengala Verde” fiquei grata por aquele espaço televisivo estar assim aberto a nos ajudar nestes pequenos passos de superação da nossa deficiência.


Sim,  só depois de saber o que significa a bengala verde para nós, Baixa Visão, é que finalmente saí de casa e continuo a manter a minha autonomia, como por exemplo, ir à SIC, ao Programa "Juntos à tarde", ser entrevistada pelos apresentadores João Baião e Rita Ferro Rodrigues, sem medo de tropeçar nos corredores e nos fios que estão no chão devido às câmaras que lá estão…

Deixo aqui o momento mais especial deste dia para além de tudo que ali vivi com tanta intensidade…

Ainda nem tinha entrado para ser entrevistada e ao fundo do corredor ouço a voz do apresentador João Baião a chamar-me: Rosária Grácio e a Bengala Verde!!!

E depois recebo um abraço apertado com enorme carinho! Desde aquele  momento percebi o quão importante é falar que existe uma bengala verde para quem sofre de baixa visão…

Sim, é possível por meio da bengala verde "ver de outra maneira" tudo o que nos acontece.


Assista a entrevista que fiz no programa "Juntos à tarde" em 
sic.sapo.pt/Programas/juntos-a-tarde/historias-de-4-patas/2017-08-14-Historias-de-4-Patas---Livro-Bia-por-um-Triz.mp4

Para mais informações sobre a origem da Bengala Verde convido-lhe a ler este artigo do meu blogue:
vercombengalaverde.blogspot.pt/2017/06/por-que-bengala-e-na-cor-verde-uma-das_15.html